quinta-feira, 30 de julho de 2009

O homem da carrocinha


E não é que Laredo também tem o homem da carrocinha? Estava em casa no final da tarde quando ouvi ao longe um sonzinho vintage, parecido com aquelas musiquinhas tocadas em circos ou em parques de diversão de cidade de interior. Começou baixinho e à medida em que foi aumentando de intensidade, percebi que algo grande se aproximava. E eis que surge enorme, colorido e extremamente convidativo, um caminhão de doces. Na verdade, um caminhão de tudo o que é porcaria que adoraríamos poder nos entupir diariamente sem culpa, sem cáries, sem banha e sem colesterol: picolé, batata chips, picles, chocolates, caramelos, chicletes, raspadinhas. Tudo o que já foi um sonho e que hoje é praticamente ilegal nestes tempos politicamente corretos.

Senti um sensação também doce e morna ao avistar aquele carro sendo conduzido pela minha nova rua. Fiquei paralisada por uns instantes, sem acreditar que existiam carrocinhas de doces, mesmo em versão motorizada, aqui nestas bandas texanas. Não apenas isto, mas o fato de ainda existirem é o que me provocou mais espanto. Os pensamentos viajaram imediatamente à infância. Passavam pelo meu bairro pernambucano o sorveteiro, o homem do mungunzá e o homem do quebra-queixo. Cada um com seu jingle, ou seja, um assobio original que os diferenciava da concorrência. Eu era fregueza assídua, magra de ruim e com os dentes cariados.

O homem da carrocinha era um senhor com cara de mexicano. Andou devagarinho rua abaixo, a musiquinha tocando tininininim ,mas nenhuma criança veio à porta. Eu torcia para que alguma aparecesse gritando suada e em êxtase atrás de um picolé. Se fosse nos meus tempos eu já teria aporrinhado a paciência da empregada para me emprestar umas moedas. Onde estavam as crianças? Será que alguém contou sobre o homem da carrocinha versão Brasil? Não, o daqui não vai arrancar seu fígado! Venham, comam os doces, não se amarguem! Mas nada. A clientela estava vazia. No ar, um que de inocência perdida. Ouvi a musiquinha trafegando pelo bairro por mais uns minutos até sumir no abafado da tarde. Nas minhas observações que me levam a crer que estou ficando velha, constato que ainda existem carrocinhas, mas não mais crianças como antigamente.

3 comentários:

  1. Estou amando seus textos, Juliana.
    Sempre crônicas bem humoradas e bem escritas, um olhar vivo para o mundo, seja no Texas ou no Brasil!
    Bjs
    Bet

    ResponderExcluir
  2. E a batata frita chips? Você resistiu? Beijos, sempre passo por aqui.
    Cecilia.

    ResponderExcluir
  3. Eita que toda mãe é coruja!! Eu que o diga (rsrs). Mas Bet está coberta de razão. Seus textos conseguem passar desde o aroma do ambiente até as sensações. Você nos convence e isso nos basta! Tem sido muito gostoso acompanhar a saga dessa nega linda nas fronteiras da vida! Beijão. Saudades. P.S. Fico sempre ansiosa pelos próximos capítulos. Em breve, teremos muitos a escrever também, nas terras geladas...se Deus permitir!

    ResponderExcluir

Eu adoro um comentário sobre as minhas coisices. Escreve, escreve!